Cruzeiros Marítimos

Entrevista – Severino Almeida / SINDMAR – Julho 2015

Revista - PortoGente

Portogente - O Sindmar pode nos relacionar quais os principais problemas dos cruzeiros marítimos na costa brasileira?

     Resposta: Crimes ambientais, violações às normas de segurança e o desrespeito à dignidade do trabalhador. Além disso, falta respeito com os passageiros. Cabe dizer que o despreparo das tripulações, recrutadas de forma aleatória em países em que não há leis que resguardem o trabalho, potencializa acidentes e gera caos em situações de emergência, como ficou comprovado na colisão seguida de naufrágio do Costa Concórdia, na costa italiana. A principal causa dos problemas relacionados aos cruzeiros está com certeza no uso de "bandeiras de conveniência", artifício que livra as empresas operadoras das legislações mais rigorosas vigentes em seus países de origem, geralmente a Europa. Como consequência desta brecha, normas marítimas acabam sendo negligenciadas, quando não ignoradas. A própria natureza da atividade - ora, os navios estão sempre em deslocamento - dificulta a fiscalização.

Portogente - Pode parecer uma pergunta ingênua, mas dá para se fazer um cruzeiro marítimo sem esses problemas que os senhores estão denunciando?

     R: Sim, é possível, mas para quem gosta de se aventurar e correr riscos. Ora, é claro que um incidente a bordo nem sempre atingirá todos os passageiros. Felizmente. Contudo, o que o histórico tem mostrado é que os acidentes e incidentes envolvendo esses navios são recorrentes no Brasil. E a causa, convém repetir, é a falta de regulamentação para a atividade.

Portogente - O que as autoridades brasileiras, e quais são elas, devem fazer para coibir esse tipo de turismo perigoso?

     R: Há projetos de lei (PLs) no Congresso destinados a regulamentar a atividade. Mas, como a imprensa, e por consequência a sociedade, tem dado pouco importância ao assunto, seria preciso saber se esses PLs são efetivamente adequados. Creio que a imprensa, sobretudo a especializada em transportes e navegação poderia dar uma grande contribuição debatendo a questão. Por que a Lei 9.432, de 1997 regulamentou todas as atividades aquaviárias deixando de fora os cruzeiros marítimos? Por que esta atividade deve ficar num vácuo legal, num limbo normativo? Respondidas essas perguntas, passaremos então a refletir de que forma deve ser esta regulamentação tendo em vista a proteção do trabalhador, do meio ambiente e das normas de navegação. Os passageiros, claro, só teriam a ganhar com isso. É possível que os PLs no Congresso tenham aspectos positivos, mas primeiro é preciso que a sociedade entenda a questão para debatê-la.

Portogente - O Brasil não tem uma regulamentação dessas operações no litoral do País? Por que? O que está no caminho dessa regulamentação? E o que seria ela?

     R: Como dito acima, esta atividade não sofre regulamentação no país, devido a uma omissão normativa, que deve ser sanada.

Portogente - Só fazem esse tipo de turismo marítimo nas águas brasileiras navios estrangeiros de cruzeiros? Se sim, as irregularidades só acontecem com eles?

R: Os cruzeiros marítimos acontecem em todo o mundo. Problemas existem em toda parte. O acidente do Costa Concordia, em janeiro de 2012, na costa italiana, que resultou em mais de 30 pessoas mortas, é a prova disso. Ocorre que, como a atividade não sofre qualquer regulação no Brasil, os riscos aqui são sempre maiores. Todas as empresas de cruzeiro marítimo que operam no Brasil são estrangeiras.

Portogente - O Sindmar tem alguma estatística sobre os acidentes que já ocorreram na costa brasileira desde que esse tipo de turismo ficou mais frequente no País?

     R: Não há estatísticas específicas no Brasil, exatamente porque não há qualquer controle legal, normativo. Os cruzeiros entram e saem de nossas águas sem pedir autorização a qualquer autoridade brasileira. Mas podemos dar um parâmetro: a ONG International Cruise Victim (ICV) faz atualização permanente dos casos de passageiros desaparecidos. Desde 1995 contabilizou mais de 200 passageiros ou tripulantes de cruzeiros desaparecidos no mundo todo.

Portogente - Quais as ações e medidas que o Sindmar vem fazendo para mudar esse cenário? O sindicato já enviou alguma demanda ao governo federal?

     R: O SINDMAR tem manifestado às autoridades sua preocupação com relação aos abusos cometidos pelos cruzeiros marítimos. As denúncias levaram à realização, em outubro de 2013, de Audiência Pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação. A audiência contou com a participação do SINDMAR. Mas esta luta não pode ser somente do SINDMAR. A imprensa especializada deve se engajar nela. O que se pretende não é o fim dos cruzeiros marítimos, mas, sim, a sua efetiva regulamentação, com adequada fiscalização, para que não haja mais riscos aos passageiros e desrespeito ao meio ambiente.

 



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