Antígona e nossa mazela |
Antígona e nossa mazela Nilson Mello* Regras em profusão, resultantes de uma intensa atividade legislativa ou normativa, características de um ativismo estatal muitas vezes contraproducente (verificável ainda que o Legislativo se veja atrelado à iniciativa de outro Poder, ou por esse substituído, em claro desvio institucional) por si só não serão capazes de criar um Estado justo e promotor do desenvolvimento. No momento em que a corrupção parece tomar proporções inéditas no país, noticia-se que há 15 projetos para combatê-la aguardando trâmite e votação no Congresso. Um desses – a ser escolhido por parlamentares sob a orientação do Executivo – receberá a missão de estancar ou ao menos reduzir o mal. E que missão! De imediato, criticou-se o fato de nenhum desses projetos ter sido desengavetado até aqui – o que seria mais uma prova de fracasso de nossas instituições democráticas. Mas esse sequer é o aspecto mais grave. A verdadeira tragédia é saber, de antemão, que qualquer um desses projetos, por melhor que possa sair do “forno” do Congresso (e aqui já vai um arroubo de otimismo) não será capaz de resolver o problema. Como temos visto, leis em profusão - decorrentes do mencionado ativismo estatal – não resolvem. E de quebra ainda engendram uma sociedade mais complexa, onerosa e burocrática - o que, ironicamente, acaba contribuindo para fomentar a própria corrupção. Por falar em tragédia, o conflito representando em Antígona vem à tona. Leis produzidas pelo “Rei” (Estado) não poderiam se sobrepor às leis naturais (ou divinas, que seriam os valores fundadores de todas as demais regras sociais). O embate entre direito natural e direito positivo, que mobilizava platéias na Grécia clássica, na verdade, nos dá a oportunidade de reconhecer que um sistema legal – uma sociedade, um Estado, um país -, para ser efetivo, precisará de regras “a priori” que possam lhe garantir orientação. De nada adianta produzirmos tantas leis se não sabemos quais são os valores fundamentais que embasam essa sociedade democrática da qual tanto falamos. O Brasil não vive uma crise “legal”, no sentido normativo do termo. Vive, na verdade, uma crise de valores. Pois nenhum político ou governante precisa de uma norma especial para saber que não pode meter a mão nos cofres públicos, no dinheiro do contribuinte. (A propósito, lembremo-nos disso na próxima eleição: salários de governador, senador e deputado não pagam mansão milionária na Costa Verde, jato executivo ou helicóptero). Em suma, quem souber como resgatar valores que garantam “Norte” ao Brasil, levante o braço. Mas atenção com a carteira.
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